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A Nulidade da Autuação de Trânsito pela Inobservância das Medidas Administrativas Exigidas

A Obrigatoriedade das Medidas Administrativas: Elemento Essencial à Validade da Autuação

A legislação de trânsito brasileira não apenas define infrações e penalidades, mas estabelece, de forma clara e obrigatória, medidas administrativas complementares que devem ser aplicadas no momento da autuação.

Essas medidas são elementos integrantes da estrutura sancionatória, funcionando como condições de validade do auto de infração.

O art. 269, § 2º, do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é categórico:

"A aplicação da penalidade não elide a aplicação da medida administrativa cabível."

Isso significa que, para determinadas infrações, a autoridade de trânsito não pode escolher se aplicará ou não a medida administrativa correspondente. A aplicação não é discricionária.

Ela é vinculada. Portanto, sua ausência compromete a higidez do auto de infração, tornando-o passível de anulação.

Medidas Administrativas como Suporte Jurídico da Autuação

Cada infração prevista no CTB carrega consigo um conjunto específico de consequências jurídicas, incluindo, além da penalidade (multa, por exemplo), uma medida administrativa necessária à contenção ou correção imediata da irregularidade.

A lógica do sistema é que a medida administrativa dá suporte técnico e jurídico à autuação.

Exemplos:

Se o agente de trânsito não aplica a medida administrativa obrigatória, mesmo tendo a oportunidade de fazê-lo, está cometendo omissão que vicia o ato administrativo sancionador. A penalidade passa a carecer de base de legalidade e proporcionalidade.

Jurisprudência: A Consagração do Entendimento de Nulidade

A jurisprudência atual consolida o entendimento de que a ausência de aplicação das medidas administrativas exigidas pela norma torna nula a autuação.

Tribunais vêm reconhecendo que tal omissão representa inobservância do devido processo legal e quebra da legalidade estrita que rege a Administração Pública.

Trechos exemplares:

Ausência de aplicação da medida administrativa de remoção do veículo ao depósito, prevista na norma. Art. 269, § 2º do CTB. Nulidade configurada.
(TJ-RS – RI 5025790-13.2022.8.21.0019, Rel. Mirna Benedetti Rodrigues)
Agente de trânsito aplicou apenas pena de multa. Irregularidade verificada. AIT nulo.
(TJ-RS – Recurso Cível 71009833179, Rel. Alan Delabary Junior)
Infração impugnada decorre de infração que exige remoção do veículo. A medida não foi aplicada. Nulidade reconhecida.
(TJ-RS – Recurso Cível 71010173664, Rel. Mirna Benedetti Rodrigues)

Essas decisões sustentam que a omissão do agente público compromete não apenas a validade do auto, mas a legitimidade do processo administrativo sancionador como um todo.

Incoerência Lógica e Jurídica da Manutenção do Auto Viciado

Manter a penalidade e os efeitos do auto de infração, mesmo quando a medida administrativa obrigatória não foi aplicada, viola o princípio da coerência jurídica.

Se a norma prevê que a infração exige uma medida administrativa específica, essa exigência é parte da própria definição do ilícito.

Não se pode desmembrar a infração da sua consequência administrativa. Ignorar a medida equivale a invalidar a constatação da infração, pois a autoridade deixou de aplicar os efeitos que a própria lei vinculou ao ilícito.

Implicações Estratégicas para a Defesa Técnica

É papel do advogado, ao analisar autos de infração, verificar:

  1. Se a infração exigia medida administrativa específica.
  2. Se tal medida foi aplicada, registrada e justificada.
  3. Se a ausência de aplicação comprometeu a estrutura jurídica da autuação.

A ausência da medida obrigatória, quando exigida pela norma, gera nulidade absoluta do auto de infração e de todos os seus efeitos. É tese consolidada, respaldada por jurisprudência firme e atual.

Conclusão: A Defesa Pela Legalidade Estrita

A Administração Pública está vinculada à legalidade, não havendo margem para decisões meramente discricionárias quando a norma exige conduta específica.

No Direito de Trânsito, isso se traduz na obrigação de aplicar todas as medidas administrativas exigidas pela infração. A omissão do agente, nesses casos, rompe a cadeia de legalidade e invalida o ato sancionador.

Portanto, a nulidade do auto de infração pela ausência de aplicação da medida administrativa cabível é uma tese técnica, legítima e estratégica.

Sua aplicação correta exige conhecimento do CTB, leitura crítica do AIT e análise objetiva da atuação do agente autuador.

Trata-se de uma ferramenta essencial para o exercício pleno do direito de defesa e da busca pela justiça material em processos de trânsito.